terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

O Pequeno e o Grande Pianista - Parte 1


O Pequeno e o Grande Pianista
Parte  1

Meu pai estava entre os pianistas mais respeitados de nossa cidade; foram muitos os concertos que executou no teatro municipal; quando o convidaram para dirigir o conservatório da cidade, abandonou uma carreira de pianista muito promissora, para se dedicar exclusivamente ao ensino da música; dizia que formar um músico era muito mais gratificante do que se exibir em consertos para platéias que não sentem a mesma paixão pela música, que os músicos sentem; ele acreditava que ninguém que ama a música verdadeiramente é capaz de viver sem fazer parte dela.
Quando eu nasci, papai já não se apresentava mais em concertos, apesar dos inúmeros convites que recebia; mas sempre indicava um dos seus alunos para substituí-lo, o que nunca permitiu que os convites parassem de chegar; todos os seus alunos sempre eram muito prestigiados; os amantes da música buscavam o estilo do mestre era sempre o encontravam; era como se a música de papai se multiplicasse por todos os seus alunos, enchendo-o de orgulho e prazer.

Papai trabalhou durante vinte e cinco no conservatório e o mais curioso era que, apesar de eu e meus dois irmãos nos formarmos músicos, nunca conseguimos estudar com papai; o grupo que estudava diretamente com ele era muito seleto e só os mais talentosos conseguiam vaga.
Papai era leal à música e não favorecia ninguém, inclusive os próprios filhos; papai se orgulhava em dizer que todos os seus alunos foram admitidos por mérito próprios e sem qualquer tipo de favorecimento; quem os escolhia era a própria música.
Papai vivia e respirava música, sempre dizia que, sem a música, sua vida não teria sentido...
Algumas palavras não deveriam ser pronunciadas... Algum anjo brincalhão pode não gostar e dizer amém.
Papai foi deitar-se às duas horas da manhã, como fazia todas as noites; limpou o piano, que ficava na sala e não era permitido que ninguém sequer tirasse a poeira, o que seria difícil encontrar, já que papai o limpava todas as noites, antes de separar as partituras que os alunos estudariam no dia seguinte.
Pela manhã, papai não se levantou, permaneceu deitado na cama com a cabeça coberta, o que muito estranhamos... Desde o tempo em que mamãe era viva que papai não perdia a hora de 8ir para o conservatório...
Maria, a nossa empregada, foi até o quarto, preocupada; papai andava reclamando, há dias, de dores no peito e achando que estava fumando muito; não se preocupou, apenas diminuiu o cigarro.
 
O grito de socorro, que Maria soltou, foi o suficiente para nos dizer que algo estava errado, mas não podíamos imaginar que seria tão grave...
Quando Maria entrou no quarto, papai já tinha descoberto o rosto e ela o viu horrorizada... Papai babava e, com os olhos vidrados, tremia convulsionando...era derrame...
Levamos papai às pressas para o hospital, mais um pouco e papai não sobreviveria, disse-nos o médico; foi um tempo de dor e sofrimento e papai não conseguiu escapar das sequelas

Ficou com o lado esquerdo totalmente paralisado; não mexia os dedos da mão e não conseguia firmar os pé, a boca ficou torta e babava bastante; o pianista já não existia mais...a depressão que se abateu dobre papai foi tão intensa, que para alimentá-lo tínhamos que utilizar sonda,, ele não queria mais comer e nem viver...


(Autor: Marcio Marcelo do Nascimento Sena- Editora: Beco dos Poetas)

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