“Sempre gostei de transformar. Acredito que quando melhoro a vida de alguém, a minha melhora junto. Estou sensibilizando a Câmara com relação aos temas de inclusão social.”
É assim que define-se Mara Gabrilli, 42 anos, psicóloga e publicitária, é vereadora na cidade de São Paulo. Sua trajetória como empreendedora social começou há 12 anos, quando fundou a organização não-governamental Projeto Próximo Passo (PPP), apenas dois anos depois de sofrer um acidente de carro e ficar tetraplégica.
“Precisei respirar com ajuda de aparelhos nos seis primeiros meses e ficava angustiada por estar dependente de uma tomada. E se acabasse a luz? O que faria? Quando pude respirar sozinha, a sensação foi de muita liberdade, que o fato de não andar mais não pesou muito”, conta Mara.
“ Mas foi no momento em que retomei minha vida cotidiana, que percebi como era ser brasileiro com deficiência na cidade de São Paulo. Percebi que faltava informação. Faltava acesso. Faltava muita coisa.” Mara criou a PPP para melhorar a qualidade de vida e promover o esporte para pessoas com deficiência e fomentar as pesquisas científicas para cura de paralisias. (Saiba mais: www.ppp.org.br) É com essa energia contagiante de mulher brasileira que não desiste nunca, que respondeu carinhosamente as perguntas da entrevista ao Literatura Periférica/ Beco dos Poetas.
1-Se a” Mara de hoje” encontrasse com a “Mara de ontem” o que ela elogiaria e que desaprovaria?
! Ela elogiaria a sua determinação e bom humor para encarar todas as adversidades que a vida lhe impôs e desaprovaria sua mania chata de não seguir à risca os horários.
2- Entre as mudanças da sua vida atual o te orgulha mais e por quê?
Me orgulho do reconhecimento do meu trabalho, pois é por meio dele que vejo o quão as pessoas melhoraram a vida e como a concepção da sociedade sobre o que é deficiência mudou também. É gratificante saber que o olhar para o diferente começou a fazer parte do cotidiano das pessoas.
3- No seu livro' Íntima Desordem', você retrata fatos cotidianos e reflexões profundas de sua vida pessoal, o que esperava que o autor sentisse quando lesse seu livro?
Não sei extamente o que as pessoas iriam sentir, até porque a interpretação das crônicas é muito relativa. A minha intenção na verdade era mostrar minhas inquietações, desejos, críticas sociais. Tudo através do meu universo.
4- Quando se fala em Literatura o que lhe vem à cabeça?
Liberdade. Sempre gostei de escrever. Para mim é uma maneira de refletir sobre as coisas e me encontrar comigo mesma. Acredito que ao escrever conseguimos nos livrar de várias agruras da nossa alma. E às vezes também conseguimos tocar outras pessoas com nossas reflexões. Esta sinergia que as palavras proporcionam entre autor e leitor é incrível.
5- Quais seus projetos culturais como vereadora?
Criei o projeto Arte Inclui, que levou mais de 14 mil pessoas com deficiência aos espaços culturais da cidade; elaborei o PL das casas de shows - que proíbe as mesmas de cobrar mais de um ingresso às pessoas com deficiência; sou autora do Projeto Ler Para Crer - que permite o acesso das pessoas com deficiência visual às obras disponíveis nos acervos das bibliotecas municipais, além disso fui uma das autoras do Projeto das Feiras de Artesanato, que tem por objetivo regularizar e promover este tipo de evento na nossa cidade.
6- O que te motivou a aceitar o convite para o ensaio sensual na revista Trip ?
As pessoas têm (pelo menos tinham) uma visão muito estigmatizada de quem possui uma deficiência. Sempre houve uma concepção de que pessoa com deficiência é feia, digna de pena... Quis mostrar que isso não é verdade. Acho que depois das fotos o olhar para o assunto começou a ganhar novos recortes. E o melhor é que outras pessoas, principalmente as mulheres com deficiência, passaram a resgatar a sua autoestima e se valorizarem.
7- Ter posado pra revista já causou algum problema em sua atividade como vereadora ( se for sim) como resolveu isso?
Não me trouxe problema algum. O ensaio foi sensual e não apelativo. Acredito que a minha postura sempre impôs respeito a todos que trabalham comigo.
8- A nova lei de inclusão nas empresas é uma oportunidade aos deficientes de mostrar seu trabalho ou apenas um marketing social da empresa?
Na verdade a Lei de Cotas já tem 18 anos. De nova não tem nada. Acontece que pelo fato do assunto não ter sido divulgado antes, as pessoas desconhecem. Por mais que as empresas contratem com objetivo de fazer marketing os benefícios que esta lei proporcionou às pessoas com deficiência é inegável. Claro, ainda falta muita gente no mercado de trabalho, mas aos poucos estamos conquistando o nosso espaço.
9- Como você vê a criação da primeira Faculdade de Educação Inclusiva do Brasil – (Faculdade de Educação Inclusiva Paulista – FEIP)?
Vejo com bons olhos e acredito que o pensamento assistencialista que reinava em grande parte da nossa realidade está mudando. As pessoas estão procurando os seus direitos, buscando ser incluídas na sociedade. A criação desta faculdade é um exemplo disto.
10-Fale da ONG "Um Próximo Passo", que hoje se chama "Fundação Mara Gabrilli".
O Instituto Mara Gabrilli, do qual que sou fundadora, nasceu depois que sofri o acidente e resolvi fundar uma ONG para fomentar pesquisas sobre paralisias. Foi por meio destas pesquisas que acabei conhecendo diversas pessoas com deficiência - que passaram a pedir patrocínio da ONG para competir em modalidades esportivas. Estas pessoas tinham muita vontade de transformar, mas não tinham acessos. Resolvi buscar recursos para o Instituto para apoiar estes atletas. Aos poucos fomos conquistando muita coisa. Chegamos a apoiar 80 atletas, sendo que alguns destes foram às Paraolimpíadas de Pequim e trouxeram medalhas de ouro para o Brasil.
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